sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A DIREITA QUER CRESCIMENTO COM DESEMPREGO E SALÁRIOS BAIXOS

A duvidosa e ténue retoma económica - tão saudada pelos governos de direita, tanto em Portugal como em Espanha, nas últimas semanas - não foi acompanhada por qualquer retoma da criação de emprego.
As ligeiras oscilações das taxas de desemprego – para além de ignorarem o nível de desemprego real – devem-se sobretudo à diminuição da população em idade de trabalhar, em consequência dos movimentos migratórios (a imigração diminuiu e a emigração aumentou) e é óbvio que a preocupante baixa da taxa de natalidade vai ter repercussões muito negativas no futuro.
Com a forte baixa do poder de compra e o aumento do desemprego de longa duração, não se vê como será possível travar a escalada do empobrecimento da população em geral, designadamente da classe média, e o aumento do sofrimento dos mais idosos.
Em Portugal, aliás, a previsão é de subida do desemprego em 2014 até aos 17,7 %. Em Espanha, neste momento, a taxa de desemprego é de 25,98 %.
O que se passa em Espanha é significativo: o fosso que separa ricos e pobres tornou-se o maior da Europa; o número de milionários aumentou 13 % em 2012 segundo um relatório do Crédit Suisse; e o desemprego tornou-se crónico.
O cenário de uma economia em estagnação (como sucedeu no Japão durante mais de uma década) é agora considerada como uma forte possibilidade em Espanha, com empresas formidáveis que exportam, investem no estrangeiro e criam emprego, mas no exterior.
Poderá suceder algo de semelhante em Portugal? Isto é: um crescimento com desemprego e salários muito baixos? É muito provável.
Num notável artigo publicado este mês no «El País», Josep Ramoneda pôs o dedo na mais grave ferida da União Europeia: a impossibilidade de criação de emprego, a curto e a médio prazo, em resultado das políticas neoliberais que vêm sendo impostas aos países em crise.
Escreveu
ele: «Todas as empresas, inclusive aquelas que funcionam e têm bons resultados, principalmente as que se dedicam à exportação, diminuem o número de empregados, ano após ano. A competitividade, horizonte ideológico do nosso tempo, que é o que tem de garantir o progresso da economia, baseia-se precisamente no desemprego e na queda dos salários, que, como é evidente, são duas magnitudes que vão de par. As novas tecnologias permitem ganhar competitividade à custa do trabalho, e em muitos casos em prejuízo das pessoas mais qualificadas, o que é desesperante para os jovens com boa formação».

Daqui decorrem várias questões essenciais:
- Como garantir uma vida decente aos cidadãos num contexto de queda estrutural do trabalho? Um debate que brilha pela ausência.
- Como tenciona a Europa adaptar-se à economia globalizada?
- Que papel podem desempenhar os Estados para que a fractura laboral não destrua as liberdades e a vida em comum?
Mas, em vez disso, os governos optam por reformas laborais que visam facilitar os despedimentos, que mandam mais gente para o desemprego e que abrem como correlativo iniludível a proliferação dos minijobs. E entretêm os cidadãos com música celestial: o discurso dos empreendedores e do valor acrescentado.
Veja-se o que está a acontecer em Portugal. Para além do desemprego acima dos 16 % - mais de metade é de longa duração e afecta cada vez mais jovens – também a diferença salarial média, entre os trabalhadores despedidos em 2011 e os trabalhadores contratados posteriormente, é de menos 11 %. Ou seja: os novos empregados recebem menos 110 euros/mês (cerca de 1500 euros/ano). Entre os que mantiveram o emprego, 55 % sofreram cortes ou viram os seus salários congelados. Isto significa que as empresas estão a ganhar com a chamada «rotação de trabalhadores». Uma tendência que o Banco de Portugal teme que resulte em perda de produtividade).
O trabalho é, no nosso sistema, aquilo que deve proporcionar meios de vida, realização e reconhecimento aos cidadãos – salienta Josep Ramoneda.
Uma pergunta desde logo se impõe:
- Será sustentável, sem derivas autoritárias, um sistema que não garante o trabalho aos seus cidadãos e que nem sequer assegura aos que têm emprego as condições mínimas para uma vida decente?
Perante esta realidade, sobra qualquer forma de triunfalismo e falta um verdadeiro debate político e social:
- Para onde queremos ir? Para uma sociedade do desemprego e dos minijobs?
O fatalismo, o determinismo daqueles que repetem uma e outra vez que não há alternativa, que não se pode agir de outra forma, só pode ser fruto de má-fé ou de impotência.

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